Vou
falar sobre uma menina de negro adormecida nos lençóis de uma cama
usada. A conheci quando vagava na noite suja dessa cidade grande. Era
linda e não sabia andar em linha reta. Ela teve amigos ótimos e
lindos, de jaquetas de couro e cigarros amassados. De pernas finas e
dedos sujos. E como amavam uns aos outros. Ela poderia ter sido uma
diva. Seria o seu fim. Em um corredor qualquer com um jeans apertado
e os olhos com sombra azul. Eu a amaria em cada passo decadente. E
seu fim seria fim de boa parte minha. E assim que ela se fosse
plantaria flores amarelas em minha área de serviço cheia de roupas
por lavar. Pois teria vivido em sua sombra de cabelos negros e
garrafas vazias e cinzas doces. E beijos doces. Ela tem lábios finos
e não sabe usar a língua. Não quer usar a língua. Certa vez
disseram que poderiam morar em seus olhos. Foi aí que entregou sua
alma – pelo visto quebrada e falida – ao estranho que a convidava
á partilha de tudo. Erro gravíssimo. Amor gravíssimo. Ela costuma
dizer que a amo de leve. A amo com medo. E tenho vergonha de meu
medo. E ela desaprendeu a vergonha do amor, Ama descarada e
desavergonhadamente o traço dos estranhos na rua os livros lidos nas
escadas, as músicas ouvidas no trem. E todos são coadjuvantes do
seu filme imaginário. Havia um garoto que a chamava de jany no
íntimo e sonhava beijar seu pescoço. Dormiam juntos todas as noites
e a selvageria era guardada nos escritos e nos acordes da guitarra.
Eu faria para ela ela uma musica a cada fim de tarde. Sei que me
espera com o chá na mesa e mil personagens mirabolantes nos olhos e
na boca. E agradeço aos céus por saber fazer amor com ela direito.
Segurar seus braços pernas e alma nos meus. Dormir em paz.
Quando
ela acorda pensa ouvir os sinos da cidade velha. Da igreja velha.
Ouvir de longe as folhas no vento. Dançar com as folhas já sem
vida. E sentir o outono entrar em seus ossos. A paz invadir os
espelhos da casa. Quantas chaves foi preciso devolver. Quantas serão.
Queria que aqui fosse bem baixo e ela pudesse atirar pedrinhas na
janela, desembocar em minha cama quente e dormir em meus braços como
se fosse perfeito. Como se fosse o certo. Juro que não reclamo das
roupas no chão e das coisas mudando de lugar. E quando ela vai
embora durmo no casaco esquecido, no rabisco do encarte no livro
lido. No molhado do choro. Eu dormiria no espaço entre ela e o sonho
agitado da noite, gravaria cada sussurro sem sentido. Quero que minha
ansia a afunde em desespero, e só o que faço é libertá-la de mim.
Então calo em desejo e rezo. Que ela fique, que finja. Que aprenda.
Que me ensine.
Adorei te ler, parabéns querida e uma ótima semana.
ResponderExcluirAbraços.
Marcos
que agradável estar entre teus escritos. voltarei mais vezes... abço
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