BEM (vem) VINDO





ENTRE SEM BATER, TIRE OS SAPATOS E TRAGA ALGUMAS MOEDAS



segunda-feira, 16 de julho de 2012


Vou falar sobre uma menina de negro adormecida nos lençóis de uma cama usada. A conheci quando vagava na noite suja dessa cidade grande. Era linda e não sabia andar em linha reta. Ela teve amigos ótimos e lindos, de jaquetas de couro e cigarros amassados. De pernas finas e dedos sujos. E como amavam uns aos outros. Ela poderia ter sido uma diva. Seria o seu fim. Em um corredor qualquer com um jeans apertado e os olhos com sombra azul. Eu a amaria em cada passo decadente. E seu fim seria fim de boa parte minha. E assim que ela se fosse plantaria flores amarelas em minha área de serviço cheia de roupas por lavar. Pois teria vivido em sua sombra de cabelos negros e garrafas vazias e cinzas doces. E beijos doces. Ela tem lábios finos e não sabe usar a língua. Não quer usar a língua. Certa vez disseram que poderiam morar em seus olhos. Foi aí que entregou sua alma – pelo visto quebrada e falida – ao estranho que a convidava á partilha de tudo. Erro gravíssimo. Amor gravíssimo. Ela costuma dizer que a amo de leve. A amo com medo. E tenho vergonha de meu medo. E ela desaprendeu a vergonha do amor, Ama descarada e desavergonhadamente o traço dos estranhos na rua os livros lidos nas escadas, as músicas ouvidas no trem. E todos são coadjuvantes do seu filme imaginário. Havia um garoto que a chamava de jany no íntimo e sonhava beijar seu pescoço. Dormiam juntos todas as noites e a selvageria era guardada nos escritos e nos acordes da guitarra. Eu faria para ela ela uma musica a cada fim de tarde. Sei que me espera com o chá na mesa e mil personagens mirabolantes nos olhos e na boca. E agradeço aos céus por saber fazer amor com ela direito. Segurar seus braços pernas e alma nos meus. Dormir em paz.
Quando ela acorda pensa ouvir os sinos da cidade velha. Da igreja velha. Ouvir de longe as folhas no vento. Dançar com as folhas já sem vida. E sentir o outono entrar em seus ossos. A paz invadir os espelhos da casa. Quantas chaves foi preciso devolver. Quantas serão. Queria que aqui fosse bem baixo e ela pudesse atirar pedrinhas na janela, desembocar em minha cama quente e dormir em meus braços como se fosse perfeito. Como se fosse o certo. Juro que não reclamo das roupas no chão e das coisas mudando de lugar. E quando ela vai embora durmo no casaco esquecido, no rabisco do encarte no livro lido. No molhado do choro. Eu dormiria no espaço entre ela e o sonho agitado da noite, gravaria cada sussurro sem sentido. Quero que minha ansia a afunde em desespero, e só o que faço é libertá-la de mim. Então calo em desejo e rezo. Que ela fique, que finja. Que aprenda. Que me ensine.



2 comentários:

  1. Adorei te ler, parabéns querida e uma ótima semana.

    Abraços.

    Marcos

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  2. que agradável estar entre teus escritos. voltarei mais vezes... abço

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obrigada por me ler. SEJA SEMPRE.